quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Já não sei o que é a Ética

A minha avó costumava dizer que "A consciência é verde, veio um burro e comeu-a".
Certamente que a Ética tem a mesma cor.

Por definição, a Ética ocupa-se da conduta humana do ponto de vista do Bem e do Mal. Daí não ter percebido logo à primeira esta notícia:


No seguimento da leitura e para tentar perceber  se o título condizia com o corpo da notícia, deparo-me com esta declaração:

 Miguel Oliveira da Silva afirmou que "não só é legítimo como, mais do que isso, desejável" porque "vivemos numa sociedade em que, independentemente das restrições orçamentais, não é possível, em termos de cuidados de saúde, todos terem acesso a tudo».

 Vindo de alguém que preside ao um Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (CNECV), estas palavras são ofensivas à dignidade humana. Se um tal Conselho aceita como natural que nem todos tenham acesso ao mesmo tipo de cuidados de saúde, porque mais dois meses ou menos dois meses de vida é igual,  apetece-me dizer que  quando um dos seus membros ou familiares tiver algum problema semelhante, não vale a pena gastar dinheiro ao estado nem diminuir as suas heranças em clínicas particulares, basta dirigir-se ao penhasco mais próximo!

Estas são letras de grande descontentamto. É demasiado orwelliano para ser a sério! Quantos milhares gastos em campanhas de Todos diferentes, todos iguais, Oportunidades iguais para todos, e agora , de repente, em nome de uma economia que borrou a pintura, debitam-se frases destas. É assustador!

Também a minha avó já dizia: "Muito tens, muito vales, nada tens, nada vales"

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Outono


 CANÇÃO DE OUTONO
Cecília Meireles

Perdoa-me, folha seca,
não posso cuidar de ti.
Vim para amar neste mundo,
e até do amor me perdi.



De que serviu tecer flores
pelas areias do chão,
se havia gente dormindo
sobre o própro coração?


E não pude levantá-la!
Choro pelo que não fiz.
E pela minha fraqueza
é que sou triste e infeliz.
Perdoa-me, folha seca!
Meus olhos sem força estão
velando e rogando áqueles
que não se levantarão...


Tu és a folha de outono
voante pelo jardim.
Deixo-te a minha saudade
- a melhor parte de mim.
Certa de que tudo é vão.
Que tudo é menos que o vento,
menos que as folhas do chão...

sábado, 8 de setembro de 2012

Descontentamento

Não passam mais - Ary dos Santos

Em nome dos nossos braços
em nome das nossas mãos
em nome de quantos passos
deram os nossos irmãos.
Em nome das ferramentas
que nos magoaram os dedos
das torturas das tormentas
das sevícias dos degredos.
Em nome daquele nome
que herdámos dos nossos pais
em nome da sua fome dizemos:
não passam mais!

E em nome dos milénios
de prisão adicionada
em nome de tantos génios
com a voz amordaçada
em nome dos camponeses
com a terra confiscada
em nome dos Portugueses
com a carne estilhaçada
em nome daqueles nomes
escarrados nos tribunais
dizemos que há outros nomes
que não passam nunca mais!

Em nome do que nós temos
em nome do que nós fomos
revolução que fizemos
democracia que somos
em nome da unidade
linda flor da classe operária
em nome da liberdade
flor imensa e proletária
em nome desta vontade
de sermos todos iguais
vamos dizer a verdade
dizendo: não passam mais!

Em nome de quantos corpos
nossos filhos foram feitos.
Em nome de quantos mortos
vivem nos nossos direitos.
Em nome de quantos vivos
dão mais vida à nossa voz
não mais seremos cativos:
O trabalho somos nós.
Por isso tornos enxadas
canetas frezas dedais
são as nossas barricadas
que dizem: não passam mais!

E em nome das conquistas
vindas nos ventos de Abril
reforma agrária controlo
operário no meio fabril
empresas que são do estado
porque o seu dono é o povo
em nome de lado a lado
termos feito um país novo.
Em nome da nossa frente
e dos nossos ideais
diante de toda a gente
dizemos: não passam mais!

Em nome do que passámos
não deixaremos passar
o patrão que ultrapassámos
e que nos quer trespassar.
E por onde a gente passa
nós passamos a palavra:
Cada rua cada praça
é o chão que o povo lavra.
Passaremos adiante
com passo firme e seguro.
O passado é já bastante
vamos passar ao futuro.